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Cronologia
Aquele menino que fui outrora, criava mundos imaginários nos intervalos entre uma tarefa e outra. O tempo era algo que não habitava minhas preocupações e eu, nessa época, nem entendia como medir as horas nos ponteiros… O Velho relógio despertador, a cordas, inúmeras vezes ficava com os ponteiros parados por que simplesmente meu pai esquecia de dar cordas, o que justificava a falta de necessidade de controlar o tempo. A vida do campo embora seja sofrida e de trabalho árduo, nos permite viver alheios aos ponteiros do relógio.
É como se, de certa forma, a gente ignorasse a cronologia do dia fazendo com que o tempo fosse menos agressivo. Não era o relógio que nos mandava ir almoçar, a gente ia quando sentia que estava na hora. Acordar ou ir dormir não era algo que precisasse de despertador ou de horário marcado.
Depois que comecei a ir na escola , quem mais usava o relógio era eu, pois eu tinha que respeitar a hora do transporte. Meu pai usava apenas quando tinha que ir até a cidade, pois para isso precisava se atentar ao horário do ônibus.
Quando surgiu o horário de verão, não teve efeito nenhum na nossa vida, pois para quem não se importa com o tempo, uma hora antes ou depois não faz diferença.
Um dia surgiu a energia elétrica, com ela uma TV, e lembro que minha vó gostava de assistir a novela do Rei Do Gado. Para essa finalidade minha vó começou também a cuidar dos ponteiros, e se organizar para não perder aquele momento.
Nem sei como foi que a contagem das horas e minutos se apoderou tanto do meu viver… Parece-me que quanto mais contamos e controlamos os minutos, menos tempo temos, quanto mais cordas damos para essa contagem, menos eficaz somos com o tempo que temos. E pra ser sincero, sinto que a vida passa muito mais depressa do que naquele tempo em que o relógio podia parar sem que a vida perdesse sentido.
Não tenho dúvidas de que a ansiedade que habita quase todos os lares têm uma ligação forte com esse incessante processo de despertar na hora certa, de não poder se atrasar, de estar sempre em função dos minutos que temos, dia minutos que faltam e do tempo que, por mais que tenhamos ele contadinho, não vimos ele passar, e o pior, não sobra nada de tempo extra para que eu consiga voltar a ser aquele moleque, e construir mundos imaginários.