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23/02/2024
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Coisinhas

    Nossa memória tem um certo dom caprichoso de guardar algumas "coisinhas" tão simples… Coisinhas essas que surpreendentemente se sobrepõem a tantas outras coisas que parecem mais sofisticadas ou mais robustas.

    As mãos eram judiadas da lida, grossas e ásperas na palma e tão lisinha na parte de cima que deixava à mostra as veias grossas… A Vó Chica tinha mãos ágeis, fortes para sovar a massa e tão calmas e suaves na hora de acariciar meus cabelos num cafuné.

    Por falar em massa, essa é uma das "coisinhas" que minha memória caprichosamente guarda em muitos detalhes como formato, modo de fazer e sabor. Sim, basta fechar os olhos para lembrar desses detalhes com muita clareza. Parece que vejo ela tentando me ensinar. Creio que ela não tinha noção de que ficaria gravado seus ensinamentos por tanto tempo…

    Ovos, farinha e sal, um pouquinho de água morna para facilitar a mistura, porque a Vó Chica queria que eu conseguisse misturar e como eu ainda era pequeno as minhas mãos não tinham força suficiente. Ainda sinto, ao lembrar, da sensação da farinha se misturando, fugindo por entre os dedos ao apertar.

    Amassar, espichar com a garrafa na mesinha que rangia as pernas como se cantasse para aquele momento. Uma nuvem de farinha para a massa não grudar ao enrolar e depois ela pedia sua "faca cabo listrado" para cortar a massa, nem tão fina, nem tão grossa. Secar e cozinhar com galinha caipira ou com feijão… Cortar era só ela que podia pois segundo ela as facas “mijavam na mão das crianças”.

    Nessa jornada da minha vida já passei por muitos restaurantes, já fui viver "experiências gastronômicas", conhecer lugares, comida e mais comidas. Se me perguntares agora qual prato eu gostaria de saborear hoje, não tenho dúvidas: A massa caseira com galinha caipira feita pela Vó Chica.

    Saudosismo? Sim! Mas eu sei que você também tem umas "coisinhas" na sua memória que experiência nenhuma apaga. É porque não há experiência melhor do que aquilo que ganhamos com amor, com ternura. Um carinho, uma comida, um brinquedo, uma brincadeira, um filme, um beijo, qualquer coisa que nos remete a um momento de amor profundo, se tornam uma "coisinha preciosa" e nossa mente guardará para sempre.

    Que a vida nos permita pedaços de tempo para registrar "coisinhas" na vida de alguém. Para que amanhã tenhamos pessoas com memórias lindas para revivê-las. E não precisamos fazer coisas grandiosas, porque a comida do melhor restaurante jamais apagará a memória de uma massa com galinha.


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Postado por:

Jácson Lusa

Jácson Lusa

Tradicionalista, poeta, pesquisador, comunicador de rádio e cursando bacharelado em adm. de empresas.

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